quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
segunda-feira, 22 de dezembro de 2008
.tenório.
Tenório era um coleccionista por excelência. Gostava de coleccionar tudo, não lhe interessava o valor das coisas. O que interessava é que pertencessem a outras pessoas. Da sua colecção faziam parte pequenos papéis, anéis, cartas, isqueiros, colheres, fotografias, livros, canetas, cabelos, lenços, bilhetes, entre outros mil e um pertences. Recolhia-os em todo o lado, na casa de outras pessoas, na rua, no eléctrico, no dentista ou na praia. Todos os lugares tinham um potencial inimaginável. Sempre mantivera este seu amor secreto, assim devia ser um amor para ele. No secretismo não havia mal entendidos e assim seria sempre só ele o único a saber que o segredo da sua colecção era no fundo uma cleptomania crónica.
Todos os dias, quando acordava revia a sua colecção metodicamente. Era necessário ter atenção para que nada se estragasse e nada se perdesse. Mas um dia Tenório enfrentou aquilo que viria a tornar-se numa tragédia. Quando conferia o bem-estar dos seus pertences apropriados apercebeu-se que algo de errado se tinha passado com o lenço que recolhera há uns anos no Hotel Ritz. Quando encontrou aquele pedaço de tecido, os seus dedos descobriram três enormes rasgões. Alguém tinha violentado um dos seus bens mais preciosos e roubado a alma daquele lenço que agora não passava de um tecido inanimado.
quarta-feira, 3 de dezembro de 2008
.a estranha.
Sempre fora assim. Calada e observadora. Gostava de passar horas sem dizer nada enquanto olhava as outras pessoas. Pensava nas vidas delas, nas pessoas a quem quereriam bem. De vez em quando, conseguia até imagina-las a fazer amor ou a morrer. Duas ideias de certo estranhas e opostas mas tão frequentes nos seus pensamentos. Mas preferia assim. De certa maneira, as vidas dos outros ocupavam-na para que não tivesse de pensar na sua própria. Na vida dos outros não havia precipício, não havia ócio, não havia fome. Havia só ela que as observava como quem sabe e gosta, ali ao pé de tanta gente. E foi sem pensar em si e no que os seus olhos ocultavam quando olhava os outros que percebeu. Afinal o que importa é fugir para não magoar e para não deixar magoar e depois voltar como se nada fosse.
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