domingo, 22 de junho de 2008

.i n c o n f e s s á v e l.

Egoísmo é a única palavra que me ocorre. Não gosto de estar sozinha, tu sabes disso. No entanto, quando estou com outras pessoas não passa senão de um escape, uma alternativa. É só mais uma oportunidade de poder usufruir de uma solidão mais recôndita.Sozinha entre as pessoas, sozinha no mundo. É assim que me sinto. Não consigo afastar este estado. Está cravado no meu corpo. Escavaram um buraco no meu coração enquanto dormia, enquanto sonhava em ser feliz, e enterraram a semente da solidão bem lá no fundo. Como faço para matá-la? Ou pelo menos fazê-la parar de crescer? Diz-me por favor.Eu não sou o que queria e tu não és o que eu esperava. Desculpa. Desculpa por te oferecer as minhas mágoas. Desculpa se insisti para que as aceitasses. Desculpa se me desiludi contigo. Desculpa se sou egoísta.Tenho o coração apertado, cheio de lágrimas que não consigo conter. A minha pele grita por ar. O sangue corre-me nas veias como se tivesse pressa, como se quisesse despachar uma tarefa que não lhe agrada. Tenho as mãos trémulas. Aquele sorriso fácil de quem está nervoso e não consegue suportar os olhares alheios. Os meus cabelos caiem como se fossem folhas outonais. De repente tenho cachos no cabelo à força de tanto os enrolar entre os dedos. Adormeço tarde e durmo mal. Sonho muito mas nunca sei o que sonho. De manhã quando me olho ao espelho os meus olhos estão baços. Como quando se olha além numa manhã de nevoeiro, sabes? Olhamos mas não vemos nada.Mantenho uma espécie de película ao meu redor. Como aqueles pisa-papéis que se agita e tudo fica inundado de neve ou então como as janelas embaciadas pela chuva. Olhamos mas não vemos o que lá está de verdade. Faço o meu papel na perfeição. Já disse tantas vezes as minhas falas que se tornou fácil. Faço de conta que está tudo bem, rio e sorrio muito, conto coisas engraçadas porque é bom quando todos se riem connosco e por momentos gostam muito de nós. De certo modo habituei-me a esta capa. Passou a ser difícil distinguir quando o que digo ou faço é verdadeiro ou só mais um disfarce. Viciei-me nestes disfarces. Tornei-me perita em dar cada vez mais veracidade a esta grande mentira, em abafar este grito que corta o ar. Um grito que vem de dentro - rompe as artérias, rasga a carne e arranca a pele.

.nos teus braços morreríamos.


"Se por algum desígnio voltar a esta terra amada gostava de ser uma árvore visitada por aves no Verão, por onde se passeassem os esquilos, onde escrevessem no casco pequenos nomes humanos apaixonados. Uma árvore de uma floresta do Norte onde no Inverno cai a neve e há aquele silêncio que tudo guarda. E que depois fosse cortada por um lenhador, pai de uma família grande e saudável, e que parte de mim fosse logo queimada, o seu calor cozendo a comida de todos e que com a melhor madeira se fizesse uma mesa onde alguém um dia escrevesse uma carta a alguém que estivesse longe para lhe dizer que a amava."


"Sam e Frank" in Nos teus braços morreríamos, Pedro Paixão